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Como as plantas lidam com as diferentes condições ambientais? Quais as habilidades que as folhas pos

A plasticidade fenotípica das folhas


Subindo uma serra, você já se perguntou por que ambientes vizinhos apresentam espécies com características tão diferentes? Altura da planta, tamanho das folhas e do caule, formato das folhas; dentre outras, são características que se modificam a medida que as condições ambientais mudam. Isso por que as condições ambientais de clima, precipitação e solo não são estáticas. Como no exemplo da subida da serra, a medida que a altitude aumenta a temperatura tende a diminuir e algumas condições ambientais tornam-se mais amenas. Isso também é influenciado pelo "lado" da serra em que você observa, se o seu olhar estiver para o lado de barlavento (região úmida) é bem provável que você verá uma exuberante floresta úmida; porém se você analisar o lado de sotavento (região seca) você provavelmente verá florestas estacionais ou savanas.

E por que o conjunto de plantas parece diferente em cada um dos ambientes? Isso acontece por que as plantas, assim como os demais seres vivos,apresentam variações nas suas características morfológicas, anatômicas e funcionais. A isso chamamos plasticidade fenotípica, que é a habilidade de um organismo em alterar sua fisiologia/morfologia em resposta à mudanças nas condições ambientais. Mas as mudanças nas condições ambientais não aconteceram somente no passado, elas continuam a se modificar constantemente, o que pode atuar como gerador para novas adaptações (Fig. 1). Essas variações nas condições ambientais atuam seletivamente permitindo o desenvolvimento de caracteres adaptativos as novas condições e eliminando as plantas não adaptadas. Para as plantas, a capacidade plástica é particularmente importante devido ao estilo de vida estático que requer que as mesmas lidem com as diferentes condições ambientais.

Trocando em miúdos, os indivíduos que ocorrem em um determinado local tem variações fenotípicas e o ambiente atua como filtro selecionando àquelas que estão mais adaptadas as condições. Assim pode-se imaginar que em um local onde as condições são mais restritivas (em condições de estresse hídrico, por exemplo), os filtros atuem de forma a selecionar características mais específicas para a sobrevivência do indivíduo. Enquanto que em ambientes onde os filtros são mais brandos (onde a água é abundante) a seleção será menos restritiva.Por força da seleção natural esses caracteres selecionados são fixados geneticamente, de forma que os caracteres adaptados tornaram-se o produto final da interação genótipo-ambiente.


Fig. 1 - Tipos vegetacionais úmidos e secos dos estados do Ceará e Piauí (a- Floresta Ombrófila (Serra da Ibiapaba, Ce), b- Savana (transição entre Cerrado e Caatinga) (Sete Cidades, Pi), c- Arredores de lagoa temporária (Chapada do Araripe, Ce); d- Savana (Chapada do Araripe, Ce) (créditos: Luciana Silva Cordeiro).

Figura 1 - Tipos vegetacionais úmidos e secos dos estados do Ceará e Piauí. a- Floresta Ombrófila (Serra da Ibiapaba, Ce), b- Savana (transição entre Cerrado e Caatinga) (Sete Cidades, Pi), c- Arredores de lagoa temporária (Chapada do Araripe, Ce); d- Savana (Chapada do Araripe, Ce) (créditos: Luciana Silva Cordeiro).


O resultado da adaptação fixada no genótipo é tão bem definido que pequenas variações no ambiente não modificam o fenótipo da planta. Todas as plantas tem a mesma capacidade plástica? A respostas é não! Nem todas as linhagens botânicas tem essa maior plasticidade e algumas permanecem com poucas modificações, apresentando conservação das características referentes as espécies por elas englobadas. Essa variação na plasticidade influencia diretamente na ocorrência das espécies sob diferentes condições edafoclimáticas. Assim, algumas linhagens se desenvolveram de forma mais restrita a determinados ambientes (como as Cactaceae que ocorrem preferencialmente em ambientes secos ou com regime hídrico irregular), enquanto que outras conseguem se manter sob diferentes condições ambientais (é o caso das Rubiaceae, que ocorrem sob os mais diferentes climas).


As folhas e suas variações


Uma das estruturas mais plásticas em uma planta são as folhas e suas variações podem ser visíveis mesmo em único indivíduo (Fig. 2). Por exemplo, uma mesma planta exibe, frequentemente, folhas morfologicamente diferentes denominadas como folhas de sol e de sombra, de acordo com o grau de exposição a que estiveram sujeitas. As folhas são órgãos que desempenham um papel importante na sobrevivência e crescimento de uma planta. Estudos anteriores revelaram que variações em atributos foliares são o resultado da adaptação da planta ao seu habitat de crescimento (Pandey e Nagar, 2002).


Figura 2 - Folha de Melanther alatifolia (Gardner) Cabrera (Asteraceae) de uma área de caatinga (savana estépica) no estado do Ceará. A direita imagem de folha do subarbusto de coleta referente a dissertação de Roberta da Rocha Miranda. A esquerda imagem da exsicata de indivíduo da mesma espécie, tombada no herbário EAC (Batista, W370)(http://www.splink.org.br/).

Portanto, o tamanho e a forma ideal dependem geralmente do ambiente em que a folha se encontra, além de fatores físicos como os níveis de luz, a dissipação de calor, disponibilidade de água, etc. Por exemplo, o tamanho da folha tende a diminuir com o aumento da altitude, com a diminuição da temperatura, precipitação média anual e com a baixa fertilidade do solo (fig. 3). Além disso, interações biológicas como a competição entre as plantas, herbivoria, polinização e dispersão de sementes também influenciam o tamanho e a forma ideal da folha. Estas diferenças no tamanho e na forma da folha acabam por influenciar uma grande variedade de processos fisiológicos importantes, como a fotossíntese, transpiração e a termorregulação da planta.


Fig. 3 - Folhas de Passiflora foetida L.(Passifloraceae) de uma área de caatinga (savana estépica) no estado do Ceará. A direita imagem de folha da erva de coleta referente a dissertação de Roberta da Rocha Miranda. A esquerda imagem da exsicata de indivíduo da mesma espécie, tombada no herbário ASE (Oliveira, EVS 150) (http://www.splink.org.br/).

Figura 3 - Folhas de Passiflora foetida L.(Passifloraceae) de uma área de caatinga (savana estépica) no estado do Ceará. A direita imagem de folha da erva de coleta referente a dissertação de Roberta da Rocha Miranda. A esquerda imagem da exsicata de indivíduo da mesma espécie, tombada no herbário ASE (Oliveira, EVS 150) (http://www.splink.org.br/).

Em geral, ambientes semiáridos como a caatinga, possuem uma prevalência de espécies com folhas pequenas ou modificadas em espinhos, pois folhas menores conseguem controlar a perda de água (Fig. 4). Outra característica foliar que sugere essa rápida resposta às condições ambientais é a senescência foliar como resposta aos períodos de seca desfavoráveis a manutenção das mesmas.

Figura 4 - Folhas de Portulaca umbraticola Kunth.(Portulacaceae) de uma área de caatinga (savana estépica) no estado do Ceará. A direita imagem de folha da erva de coleta referente a dissertação de Roberta da Rocha Miranda. A esquerda imagem da exsicata de indivíduo da mesma espécie, tombada no herbário CEN (Allem, AC 1371) (http://www.splink.org.br/).

Consistência, tamanho, fenofase e outras características foliares podem ajudar a explicar a relação das folhas com os seu entorno. Analisar e observar essas características, além de outras como a quantidade de estômatos, a presença de glândulas ou tricomas ou a coloração, ajudam a compreender o papel desse importante órgão para a manutenção da planta e sua interação com outras espécies ou com o meio ambiente que a cerca.

Vamos tentar um desafio? Na próxima vez que você olhar para as folhas de uma planta, não observe somente a beleza das mesmas, tente buscar quais características foliares estariam revelando uma história adaptativa que ainda está acontecendo nesse momento!


Referências

Begon,M.; Harper, J.L. &Townsend,C.R. 2007. Ecologia - de indivíduos a ecossistemas. 4ª ed. Artmed., Porto Alegre.

Flora do Brasil 2020 em construção. Jardim Botânico do Rio de Janeiro. Disponível em: <http://floradobrasil.jbrj.gov.br/ >. Acesso em: 05 Out. 2016

Gianoli, E. & Palacio-López, K. 2009. Phenotypic integration may constrain phenotypic plasticity in plants. Oikos118: 1924–1928.

Harris, M. S. & Pannell. J. R. 2010. Canopy seed storage is associatedwith sexual dimorphism in the woody dioecious genus Leucadendron.Journal of Ecology 98: 509–515.

McDonald, P.G.;Fonseca, C.R.; Overton, J.McC.&Westoby, M. 2003. Leaf-size divergence along rainfall and soil-nutrient gradients: is the method of size reduction common among clades?Functional Ecology17: 50–57.

Pandey S. & Nagar P.K. 2002. Leaf surfacewetness and morphologicalcharacteristics of Valerianajatamansigrown under open and shade habitats. Biol Plant. 45: 291–294.

Raven, P.H.; Evert, R.F. &Eichhorn, S.E. 1996. Biologia Vegetal. 5 ed. Guanabara Koogan, Rio de Janeiro.

Rizzini, C.T. 1997. Tratado de fitogeografia do Brasil: aspectos ecológicos, sociológicos e florísticos. 2 ed. Âmbito Cultural Edições, Rio de Janeiro.

Schlichting, C.D. 1986. The evolution of phenotypic plasticity in plants. Annual Review of Ecological and Systematics 17:667–693.





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